Saturday, November 28, 2009

INTELECTUAL DE ESQUERDA NA POLÍTICA E NO PODER - DIALÉTICAS




Ao ler duas reportagens na imprensa, aparentemente bastante desconexas uma da outra, lembrei-me da candidatura de Jampa. Vamos às reportagens:

A primeira foi uma reportagem na Folha de S. Paulo sobre o aniversário do Centro Brasileiro de Planejamento (Cebrap), centro este que abrigou a nata da intelectualidade petista e tucana nos anos da ditadura. Um dos pesquisadores do Cebrap, o crítico literário Roberto Schwarz, acredita que a proximidade do intelectual de esquerda com o poder pode ser perigosa. Indo na contramão das análises ufanistas sobre o Brasil, Schwarz afirma: "
O que me parece errado é adotar uma visão rósea do curso geral do capitalismo porque o Brasil está com o vento a favor ou porque temos amigos no governo".

A segunda reportagem foi sobre o ranking de violência e vulnerabilidade juvenil montado pelo Ministério da Justiça. A Região Metropolitana do Recife aparece na 6a e 7a posição com Cabo de Santo Agostinho e Jaboatão dos Guararapes. São cidades onde a probabilidade do jovem ser vítima de violência é maior, comparada a outros lugares do Brasil.

O que as duas reportagens têm a ver uma com a outra? Bem, a segunda nos mostra que a violência na RMR é ainda absolutamente inaceitável, apesar de alguns tímidos avanços em algumas estatísticas. A frase de Schwarz, na primeira reportagem, de certo modo alerta para que não caiamos na auto-complacência por estarmos vivendo num período de prosperidade econômica. O intelectual de esquerda não pode, em momento algum, flertar com essa satisfação oficialista e as versões chapa-branca da realidade. Seu ofício é sempre desconfiar dos ufanismos. Ainda que tenha havido avanços, o simples reconhecimento desses avanços não pode aplacar nosso inconformismo diante de uma realidade sob vários aspectos tão abjeta e que exige ainda tanto trabalho e crítica.

Reconheço que a lógica do político é diferente. Se eleito deputado estadual, Jampa fará parte de um projeto maior, com articulações federais e estaduais, e não sei até que ponto achará uma posição confortável para criticar e se inconformar com a realidade existente num contexto em que ele estará, muito provavelmente, do lado do governo tanto no plano federal como estadual.

Não sou político e não prentendo ser um. Apenas gostaria de provocar o meu amigo Jampa. Espero que o intelectual de esquerda que conheci, o sociólogo preocupado com as lógicas de reprodução da desigualdade em nossa sociedade, continue ativo, caso chegue ao poder. Espero que seu desejo de transformação e sua inquietação diante de uma realidade inaceitável seja o começo da escalada da imaginação ao poder.

Cesar Melo

Cesar Melo estudou ciências sociais na UFPE, onde foi colega de turma de Jampa. Fez doutorado na Universidade da California e hoje é professor de literatura na Universidade de Chicago.

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